O Projeto RADAM (RADar na Amazônia)
constitui-se em um dos maiores esforços já realizado pelo governo brasileiro no
sentido de mapear a Amazônia. Os resultados do Projeto culminaram com
levantamento de todo território brasileiro sob a denominação de PROJETO RADAM
BRASIL. A utilização de radar para mapeamento começou no Quadrilátero Ferrífero
(MG) pelo projeto SERE do INPE/NASA e em função dos excelentes resultados
auferidos foi ampliado até atingir toda a Amazônia Legal e em seguida para o
Brasil através do Projeto RADABRASIL.
A idéia de montar o RADAM surgiu quando o Prof.
Luiz Henrique Aguiar de Azevedo estava na Nasa, participando no programa
espacial na qualidade de Principal Investigator na área de meio ambiente
e recursos terrestres. N ocasião o professor tive que fazer um curso de
especialização em RADAR em um dos maiores fabricantes do mundo.
Após o primeiro contato com o equipamento pensei em
aplicá-lo na Amazônia, pois, pelo fato de o local ter muitas nuvens, não seria
possível tirar fotografias de avião através de câmeras comuns e, sem uma
fotografia, os técnicos, geólogos, engenheiros e outros não poderiam estudar o
meio ambiente amazônico. A única forma de fazer o estudo seria por meio de um
sensor, que penetrasse nas nuvens. Um equipamento que faz esse trabalho é o
radar. Na mesma época eu pertencia ao Ministério de Minas e Energia e sugeri ao
então ministro a criação do projeto. Ele aceito (AZEVEDO, 2009).
A logomarca do Projeto RADAM, criada pelo
falecido fotogrametrista Paulo Sergio Rizzi Lippi, consistia em gaivota, que
possui uma acuidade visual cerca de oito vezes superior a do homem, e que
representava a aeronave Caravelle que era utilizada pra transportar os equipamentos
de radar e câmeras fotogramétricas, incluindo a antena que se posicionava na
sua parte inferior para a emissão e recepção das ondas de radar. O sol, na
logomarca, representava simbolizava a própria energia do radar, pois é um
sensor ativo.
Figura
1 -
Logomarca do Projeto RADAM.
O
projeto de mapeamento do Brasil fazia parte integrante do denominado PIN (Plano
de Integração Nacional) na década 70. O projeto enfrentou inúmeros desafios em
função de sua metodologia, pois, como realizar levantamento temático de uma
região tão ínvia e impérvia, como a Amazônia brasileira. As atividades de campo
culminaram na morte de 55 vidas entre técnico nível superior, nível médio,
auxiliares técnicos e militares. Os acidentes foram em aeronaves (31 vítimas),
helicópteros (8 vítimas), abertura de clareiras (4 vítimas), doenças (7
vítimas), viaturas (3 vítimas) e barco (2 vítimas).
O
projeto utilizou um Radar de Visada Lateral, da GEMS (Goodyear Eletronic
Mapping Sytem) na faixa das micro-ondas complementando por outros sensores do
ótico, visível e infravermelho próximo. A escolha do sensor de Radar de Visada
Lateral foi escolhida por sua característica de possibilitar o levantamento da
Amazônia brasileira e áreas adjacentes em tempo recorde e com resultado
plenamente satisfatório.
GEMS foi o
sistema de radar aerotransportado usado no Projeto Radambrasil, com banda X
(3,1 cm) e polarização HH. Possui ângulo
de incidência de 45-77° e resolução espacial de 16 metros. No Projeto
Radambrasil, as imagens foram analisadas no formato analógico para mapeamentos
de geologia, geomorfologia, pedologia e de vegetação. No final da década de 90,
essas imagens foram escanerizadas, possibilitando o seu uso no formato digita.
Entre
as características do Radar de Visada Lateral, da GEMS pode-se citar o relace
das formas de relevo, independência em relação às nuvens, energia própria,
homogeneidades das feições radar-gráfica sob forma de textura e tom, velocidade
de levantamento e certa independência em condições climáticas.
O Radar tem boa
penetração nas nuvens; o que possibilita ao radar imagear sob intensas
condições de nebulosidade. Esta característica assume grande importância em
regiões tropicais, onde a presença de nuvens é frequente, restringindo a
utilização de sensores ópticos. Adicionalmente, o radar é capaz de imagear a
superfície terrestre independentemente da iluminação solar, devido sua à
capacidade em utilizar sua própria fonte de energia.
Estas
características do radar imageador fazem com que ele seja amplamente utilizado em
grandes projetos de mapeamento de recursos naturais renováveis e não renováveis.
Particularmente, em investigações geológicas, as imagens de radar têm sido
utilizadas com sucesso em ambientes de florestas tropicais chuvosas da América
Central, América do Sul e Sudeste Asiático. O uso de radar nestas regiões serve
como dado básico no reconhecimento geológico, na pesquisa mineral e na
exploração de hidrocarbonetos, bem como
nos estudos geomorfológicos, florestais
e na preparação de mapas topográficos (Werle, 1988).
O
princípio do sensor de Radar baseia-se em enviar uma onda e aguardar o seu
retroespalhamento. Dependendo de sua intensidade, irá influenciar no tom e
construirá uma imagem de uma região tendo grande visibilidade de sua geometria.
O voo da aeronave com o sensor de radar durava de 3 a 4 horas e com velocidade
média de 700Km.
Figura 2 - Imagens de radar
aerotransportado com feições de relevo.
As
sombras em imagens de radar indicam áreas na superfície do solo não iluminadas
pelo radar e objetos altos. Como nenhum sinal de retorno é recebido pelo
sensor, as sombras de radar exibem uma tonalidade muito escura na imagem. O
encurtamento de pendentes na imagem é ocasionado pela encosta íngreme do objeto
(Pico da Neblina) a base, a encosta e o topo da montanha são iluminados
simultaneamente e, portanto, ocupam a mesma posição na imagem ocasionando o
encurtamento de pendentes (E). Podemos também identificar na imagem uma
inversão de relevo (Layover), pois se tratando em um objeto bastante elevado,
teremos energia refletida e recebida pela parte superior de uma feição antes do
retorno do sinal da parte inferior dessa mesma feição.
O
volume de informações gerou uma série chamada de Levantamento de Recursos
Naturais (LRN) que constituiu e constitui num inegável conjunto de informações
precisas de posicionamento das unidades mapeáveis na escala de trabalho,
traduzindo em textos e mapas temáticos, abrangendo um conjunto integrado de
dados Cartográficos, Geológicos, Pedológico, Vegetação e Uso Potencial da
Terra.
Figura 3 – Volume 23 do Levantamento de
Recursos Naturais (LRN) projeto RADAM.
Fonte –
Leonam, 2010.
Todavia,
ainda gerou uma equipe multidisciplinar e integrada, altamente treinada que
posteriormente foram incorporadas no IBGE (Instituto Brasileiro de Geografia e
Estatística).
Figura 4 – Imagem do radar com
suas texturas e tons radar gráfica.
A imagem acima é de Radar de
Visada Lateral (RVL), com linha de vôo no sentido norte-sul. A interpretação
será feita através do método de interpretação dos elementos radargráficos
(feições), auferidos em cinco diferentes estádios (etapas): Leitura,
Reconhecimento, Identificação, Análise e Interpretação (IVAN, 1995 p.1). Pela
leitura dos elementos da imagem podemos perceber que se tratar de uma área
bastante acidentada. Através do agrupamento dos elementos de mesma feição em
função da textura, que é definida na imagem como “elemento de imagem" ao
sinal de retroespalhamento referente a um determinado pulso, cujo conjunto
forma a imagem de uma determinada cena (IVAN, 1995 p.26).
Assim, agrupamos 6 tipos
diferente de feições que foram caracterizada pela rugosidade do terreno
imageado (Área 2, 4, 5 e 6). Isso nos leva a interpretar como uma região
montanhosa, (Área 2), com uma bastante acidentada (Área 4, 5 e 6). Algumas
dessas elevações são de topo plano (Área 6) e agudos (Área 2). Este
interpretação também pode ser ratificada em função das sombras desses objetos
que “constitui uma das principais características das imagens de Radar
[...] e é de grande relevância para que
o intérprete possa ter a noção de terceira dimensão [...] na imagem... (IVAN,
1995 p.34).
Na área 2 também podemos perceber
que possivelmente tivemos o fenômeno de encurtamento de radar que “corre nas
pendentes voltadas para a antena (reflexão frontal aguda), que devido aos seus posicionamentos geométricos terão um
único retorno, mostrando-se brilhante (tons brancos no RVL), sob a forma de
linhas ou traços grossos (IVAN, 1995 p.36). Podemos identificar a presença de
trechos de drenagens entre a área 1 e 2 em função da disposição irregular na
superfície e antigos canais entre a área 2 e 3. Na área 3 temos uma superfície
de rugosidade com volume de espalhamento
causado por vegetação em função de sua complexidade de sua copa que é distintos
pelo seu retroespalhamentos de sinal.
Assim podemos perceber a potencialidades das imagens de Radar de Visada
Lateral em mapeamentos, devido principalmente a extensas sombras, e outros
fenômenos que somente os sensores de radar são capazes de detectar,
principalmente em áreas com bastante presença de nuvens como a Amazônia.
Diante
do exposto acima, observa-se que equipes técnicas do RADAM tiveram que
desenvolver uma sistemática de procedimentos metodológicos inéditos em todo o
mundo, a fim de em curto período de tempo promover o conhecimento de recursos
naturais de uma região tão desconhecida.
Figura 5 - Joaquim Eduardo Witgen Barbosa
analisando uma carta obtida pelo projeto Radam - Brasil (Mapeamento completo do
País, utilizando técnicas de sensoriamento por radar). Fonte - http://www.inpe.br/50anos/linha_tempo/67.html
Um dos principais desafios enfrentados pela
equipe do RADAM na região amazônica foi, indubitavelmente, o “modus operandi” da “verdade terrestre”, ou seja, da equipe de campo, pois, em uma região
tão ínvia, inóspita e impérvia, com carência de vias de acesso, em especial nos
interflúvios, desabitada e densa floresta ombrófila impenetrável. Os grandes
desafios era verificar “in loco” os diferentes temas abordados, em razão de ser
uma região com parcas rodovias, normalmente em péssimas condições de
trafegabilidade, e as vias de acessos naturais, como os rios e igarapés,
necessitarem de uma logística mais apuradas.
Os
trabalhos temáticos e multidisciplinares do projeto RADAM resumiram-se nas
seguintes etapas: bibliografias, interpretação temáticas preliminar, trabalham
de campo, integração multidisciplinar, e produto final temático.
Os
produtos gerados tiveram a assistência técnica de uma empresa Norte Americana,
Earth Satellite Co. Essa empresa foi responsável pela preparação de
especificações e aquisição de dados terrestres, inspeção e aceitação das
imagens e dos mosaicos finais. Outra empresa contratada foi a Lasa Engenharia e
Prospecções S.A. A Lasa ficou responsável pelo voo, controles de terra e
mosaico controlado e semi controlado.
A
interpretação das imagens, trabalho de campo e confecções de mapas foram
realizada pela equipe do RADAM. Foram confeccionados 10 mapas, quais sejam: o
geológico, o metalogenéntico, o do potencial de recursos hídricos, o
geomorfológico, o fitoecológico, o exploratório de solos, o de aptidão
agrícola, o de usos e potencial da terra, o de subsídios de planejamento
regional. Logo, reduziu-se 38 volumes da Série Levantamento de Recursos
Naturais (LRN).
Foram
interpretadas 551 mosaicos semicontrolados de radar, na escala de 1/250.000.
800 profissionais, sendo 400 técnicos de mapeamento de nível superior e
aproximadamente 400 técnicos de nível superior e médio, das áreas de apoio
técnico, administrativo e logística. Até 1980, projeto possuía 702 servidores
que posteriormente forma incorporados ao IGBE em 5 março de 1984.
Assim,
o projeto RADAM deixou importante legado, repleto de experiências, frutos de
seus próprios esforços, de sua luta e de sua pertinácia. A principal delas são
os volumes do Levantamento de Recursos Naturais (LRN) em número de 38 dos quais
34 impressos em papel e/ou CD-Rom, e 4 em CD Rom. Os LRN, deixado pelo projeto
RADAM, são de grande valia, em razão de vários cartográficos na bacia do rio
Solimões. Tais produtos são extremamente consultados até hoje e serviram de
suporte para Estudos de Impactos Ambientais e Relatórios de meio Ambiente,
Zoneamento Ecológico-econômico e Potencial geoambiental, em especial os da
região amazônica.
Outra
herança de grande relevância foi a forma de vários profissionais especializado
em recursos naturais e meio ambiente, os quais no decorrer dos trabalhos de
campos, laboratórios e escritórios adquiriram experiências, em razão do
trabalho holístico-sistêmico desenvolvido durante o projetos. No universo de
pontos positivos do RADAM pode-se citar a descoberta do Complexo Carbonatítico
de Seis Lagos. Da Serra do Inajá e Serra do Ipitinga, Serras da Surucucu, Serra
da Providência dentre outros.
O
projeto RADAM representa até hoje a maior experiência mundial no estudo de
imagem de Radar de Visada Lateral, no campo dos recursos naturais, renováveis e
não renováveis, cujo resultado está hoje materializado nos 38 volumes do
Levantamento de Recursos Naturais. No final de sua existência o projeto foi
incorporado ao Ministério do Planejamento, em razão de sua absorção pelo IBGE.
Referência Bibliográfica
IVAM. M. C. Projeto RADAM: Uma Saga na Amazônia. Ed Pack Tatu,
Entrevista: Prof. Luiz
Henrique Aguiar de Azevedo, Fev/2009. Disponível em: http://www.eng.uerj.br/entrevistas/lhazevedo/ Acesso em 07 de agosto de 2013.